Avestruz contagiosa
Diz a lenda que a avestruz, quando ameaçada, esconde a cabeça no solo, no primeiro buraco que encontra. A interpretação mais comum é a de uma tentativa de escapar deixando de olhar o perigo.
O que os olhos não vêem, o coração não sente, diz outra crença.
Você provavelmente entende como ridícula essa reação. A ameaça não vai desaparecer. E a avestruz, com a cabeça enfiada no buraco, vai ser presa fácil para os predadores ou animais peçonhentos dos quais quer escapar. Melhor seria correr ou enfrentar.
O interessante é que essa atitude de avestruz está espalhada em volta da gente sem ser percebida. Na vida cotidiana, por exemplo, quantos pais e mães preferem não ver as artes que o filho está fazendo? Ou pior, os traficantes dos quais virou cliente?
O pior marido traído não é aquele que não quer ver? Diziam durante a novela Avenida Brasil que o personagem Tufão era tão corno, mas tão corno, que só ia descobrir no Vale a Pena Ver de Novo.
A política brasileira também está infestada de avestruzes.
No plano federal, o ex-presidente Lula jurava beijando a cruz que o mensalão nunca existiu. Como será, então, que o operador Marcos Valério pega pena de 40 anos de prisão no julgamento do Supremo e o poderoso chefão Zé Dirceu recebe condenação por formação de quadrilha?
Para o governo paulista de Geraldo Alckmin, é o PCC que não existe. Os policiais morrem que nem moscas, a Polícia Militar anuncia que vai colocar mais 21 mil policiais na rua mas o PCC continua não existindo. O pior cego é aquele que não quer ver…
E no plano municipal, o prefeito João Paulo Papa, de Santos, diz acreditar piamente que a verticalização não compromete a qualidade de vida. O sistema viário infartado, a mobilidade urbana ameaçada de colapso, motoristas à beira de um ataque de nervos… e o prefeito candidamente diz que quando uma torre de trocentos apartamentos cada um com múltiplas vagas de garagem é erguido onde antes havia 3 ou 4 casas não há impacto na qualidade de vida…