Blog do Paulo Schiff

Ideias e Opiniões sobre o cotidiano.

Arquivo para a tag “Portos”

Medida Provisória 595, da regulação portuária, no Congresso: explosão ou chabu?

Medida Provisória 595 que revoga a Lei 8630/93 de Modernização dos Portos

Medida Provisória 595 que revoga a Lei 8630/93 de Modernização dos Portos

No próximo dia 04, vai ser instalada a comissão mista do Congresso – 14 senadores e 15 deputados – para análise da Medida Provisória 595 que revoga a Lei 8630/93 de Modernização dos Portos e altera significativamente a regulação do setor portuário no Brasil. 

Medidas provisórias valem como lei por até 120 dias no máximo. Os 60 dias iniciais podem ser prorrogados por igual período. Para se tornarem leis, precisam ser aprovadas pelo Congresso. É o caso da MP 595. Publicada no Diário Oficial no dia 06 de dezembro, ela tem esse prazo de validade. Na conta, deve ser descontado o período de recesso do Congresso.

Uma MP tem risco mínimo de rejeição pelo Congresso Nacional. Uma das raríssimas exceções, historicamente e curiosamente, tem relação com o setor portuário. Em dezembro de 2006, depois de muita polêmica, o governo do presidente Lula, reeleito, mas enfraquecido pelo escândalo do mensalão, desistiu de aprovar a MP que alterava a abertura e a operação dos portos secos.

Um ano depois, ainda fragilizado, outra derrota legislativa histórica: a rejeição da prorrogação da Contribuição Provisória Sobre a Movimentação Financeira – CPMF. Essa não era MP.

As condições do Senado e da Câmara neste início de 2013 não têm nada a ver com 2006 e 2007.

Para começar, a nova regulação do setor portuário é vista como mais um passo na direção da redução do Custo Brasil, depois das enérgicas reduções das taxas de juros e das tarifas de energia elétrica. Que parlamentar teria coragem para votar na contramão desse processo considerado vital para o país e simpático a dez entre dez meios de comunicação?

A nova regulação tem essa aura. Olhada mais de perto, entretanto, parece feita sob medida para sacramentar legalmente dois mega-empreendimentos portuários bilionários em andamento: o do empresário Eike Batista em São João da Barra (RJ) e o terminal Embraport / Odebrecht em Santos. Ambos, sem a nova regulação teriam problemas legais para movimentar majoritariamente – como pretendem – cargas de terceiros.

Portos públicos organizados passam a sofrer concorr~encia de portos privados e um caso emblemático – que assusta a comunidade portuária – é o de Itajaí. O porto público submetido a essas condições definha e a tendência ´pe a de que seja colocado para respirar por aparelhos.

A liberação da contratação de trabalhadores desvinculados dos OGMO’s – Órgãos Gestores de Mão de Obra – criados pela Lei 8630, é um dos principais fatores desse assombro. Pode ter sido colocada na MP 595 como aquela história do bode na sala e retirada sem nenhum problema para facilitar a aprovação da MP.

No século passado, uma ameaça desse porte aos portos públicos provocaria reação explosiva. Neste início de século 21, a tendência é de que essa explosão dê chabu e se dissolva na geléia geral.

Nova regulação portuária: velhos interesses em jogo

O governo federal manifestou a intenção de alterar a regulação do sistema portuário. Uma porque a Lei dos Portos, que privatizou a operação, completa 20 anos em 2013. Algumas adequações ao cenário atual precisam ser feitas. E outra que a dinâmica do comércio internacional também se modificou nesse período. O país precisa de investimentos em infra-estrutura em várias áreas para ganhar competitividade. E uma dessas áreas é a dos portos. A nova regulação precisa abrir caminho para esse fluxo.

Vários estudos foram promovidos para subsidiar essas modificações. E agora estamos em plena temporada de opiniões, palpites e puxadas de brasa para a própria sardinha. É natural. São vários setores envolvidos na movimentação portuária de cargas e cada um deles tem interesses específicos. 

No meio desse cruzamento democrático de idéias e argumentos, entretanto, é preciso baixar a poeira para que a questão ganhe a visibilidade técnica e política necessária para embasar decisões equilibradas e sensatas.

Uma das idéias que está no ar é a de que a exigência de carga própria no Decreto 6620 inibiu a implantação de novos portos e terminais.

O Decreto foi instituído pelo Governo Federal, por meio da Secretaria Especial de Portos, para disciplinar a concessão de novas estruturas portuárias no Brasil em 2009. Pelas regras, as empresas interessadas em implantar as instalações devem comprovar a existência de carga própria, exigência considerada inviável por alguns investidores. A futura empresa operadora tem de fazer também os estudos de viabilidade ambiental e, depois, pedir a realização de licitação para a concessão.

Acontece que a exigência de carga própria não foi instituída pelo 6620. Ela já faz parte da Lei dos Portos, no artigo 4º. Existe, portanto, desde 1993.

A queda de investimentos está ligada a vários outros fatores que vão desde o cenário internacional de crise até o prazo necessário para aprovação de projetos pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários – Antaq. O período de tramitação de projetos portuários é diretamente proporcional aos cuidados com o ambiente que a legislação brasileira passou a exigir nas últimas décadas.

Também tem fundamento frágil atribuir a essa queda perfeitamente natural de investimentos neste período pós-crise um pior desempenho dos portos brasileiros no ranking do Fórum Econômico Mundial. Mesmo porque a avaliação internacional aponta problemas brasileiros muito mais agudos no ambiente de negócios do que na regulação de transportes.

É necessário apontar ainda como extremamente positivo o espírito de flexibilização que tem inspirado a regulação do setor portuário pela Antaq. Mas essa análise fica para o próximo texto, na quinta-feira.     

Cadeia Logística Segura

Nesta segunda-feira foi iniciado o transporte da primeira carga monitorada pelo sistema da Cadeia Logística Segura. Trata-se de carne de exportação, produzida no interior de SP e que vai ser embarcada em Santos.

A tecnologia é brasileira, desenvolvida pela equipe do Professor Eduardo Dias, do Departamento de Automação de Sistemas Elétricos e Portuários da Escola Politécnica da USP. Remédios e combustíveis também já têm sistemas prontos nesse projeto de plataforma aberta e de uso não-obrigatório.

Portuários à beira de um ataque de nervos

A Companhia Docas do Estado de São Paulo tem trajetória oposta à das privatizações da década de 90. Passou de empresa privada para a esfera pública em 1981. De lá para cá teve uma sequência de administrações montadas a partir de apadrinhamentos políticos. Com todas as consequências que esse tipo de direção acarreta.

Primeiro transformou-se num cabide de empregos. Depois vieram as quebras de continuidade porque presidentes e diretores eram trocados cada vez que o poder federal mudava de mãos. Mergulhou em alguns períodos na incompetência absoluta. Ou seja: caminhou para um buraco negro.

Durante o primeiro mandato do presidente Lula, a quizumba atingiu o ponto máximo. Os cargos foram todos loteados entre parlamentares que apoiavam o governo. O presidente se reportava ao notório deputado federal Valdemar da Costa Neto, que se enrolou todo no comecinho do mensalão. Cada diretor tinha um padrinho diferente. Chegou a haver um episódio em que um diretor combinou durante o dia com um prefeito da Baixada uma reunião no Ministério dos Transportes em Brasília no dia seguinte e à noite desmarcou por ordem do deputado responsável pela indicação dele para o cargo. E o assunto da reunião era não só importante como urgente…

O período foi tão turbulento para o Porto que gerou a necessidade de uma rigorosa correção de rota.

No início do segundo mandato de Lula, essa guinada foi providenciada. Foi criada a Secretaria Especial dos Portos, comandada por um ministro – Pedro Brito – com perfil de gestor. E a diretoria das companhias docas em geral e da paulista em particular ganharam perfis técnicos.

O mercado, sensibilizado, agradeceu.

Imbroglios antiquíssimos passaram a receber tratamento técnico. Verdadeiras novelas mexicanas: avenidas perimetrais em Santos e em Guarujá, dragagem de manutenção e aprofundamento do canal de navegação, remoção dos destroços do navio grego Ais Giorgis, incendiado e naufragado em 1974, são algumas delas.

A direção da Codesp ganhou reconhecimento suficiente até para uma participação bem-sucedida na discussão da construção de uma ligação seca entre as duas margens do porto

O Conselho de Autoridade Portuária, nesse período, entrou em sintonia com essa postura de valorização da técnica. O secretário de Assuntos Portuários e Marítimos de Santos, Sérgio Aquino, profissional do ramo, foi conduzido à presidência do Conselho. E as duas instâncias estiveram, nesse período, falando a mesma linguagem.

Mas não existe bem que dure para sempre.

2012 é ano eleitoral.

Sérgio Aquino deixou a presidência do CAP para vestir a roupa de pré-candidato do PMDB à Prefeitura de Santos. Foi substituído pelo secretário de Planejamanto da cidade, Bechara Abdalla. Que está na mesma frequência política do antecessor de quem era colega no secretariado do prefeito Joaõ Paulo Papa. Mas que não tem a mesma familiaridade com a atividade portuária.

E agora é o presidente da Codesp, José Roberto Serra, que está ensaiando para deixar o cargo.

O mercado, preocupado, tem acendido velas de sete dias. Afinal, em ano eleitoral, o risco de mais nomeações políticas fica multiplicado.

Gestão profissionalizada nos portos

Dizem que para o bom entendedor meia palavra basta. O observador atento das questões portuárias tem bem mais que isso neste momento. Um dicionário de palavras inteiras mostra que vai haver uma chacoalhada daquelas na gestão dos portos brasileiros.

Começa com a decisão da Antaq de licitar os terminais com arrendamentos anteriores à Lei de Modernização dos Portos. Não é nem o caso de relacionar nessa coleção de palavras e fatos inteiros essa decisão, já comentada aqui há 15 dias. E que representa um divisor de águas. Uma vitória da transparência. A lei, de 93, previu duas renovações de dez anos nesses contratos. Elas vencem no ano que vem. E apesar das gigantescas pressões em contrário, as concessões vão ser licitadas.

Depois vem a tradução direta da preocupação do governo federal com a gestão das companhias docas. Na semana passada o ministro dos Portos, Leônidas Cristino, e a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, se reuniram com cinco das entidades mais representativas das empresas que atuam no setor: ABTRA, Centronave, ABTP, Fenamar e Abratec.

A pauta era a profissionalização dessa gestão. Na comparação com o desempenho de empresas privadas, as companhias docas fazem feio. Por isso começa a ganhar espaço a idéia de estender para os portos os leilões bem-sucedidos que privatizaram a operação de três dos mais importantes aeroportos do Brasil: Viracopos, Brasília e Cumbica.

São realidades diferentes. O escoamento de 95% do comércio internacional brasileiro confere aos portos uma escala diferente da dos aeroportos. A vigilância sanitária, as questões fitossanitárias e a política industrial de estocagem estão entre os muitos fatores que não permitem uma concessão semelhante à que foi feita com sucesso para Cumbica, Viracopos e Brasília.

Outra evidência das mudanças que estão sendo gestadas é o Plano Nacional de Logística Portuária. Muita gente torce o nariz para o PNLP. Mas ele é uma realidade que brotou de uma cooperação entre a Secretaria Especial de Portos e a Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Que certamente não foi feita à toa.

Se não bastasse isso tudo, ainda tem uma revisão na Lei dos Portos. Aqui o contratante é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES. A licitação para essa revisão foi vencida pelo consórcio Booz&co e Verax Consultoria.

Quase 20 anos depois dessa Lei de Modernização, a 86390/93, o modelo baseado nos órgãos gestores de mão-de-obra – OGMOs – dá claros sinais de esgotamento. Os centros de excelência portuária, previstos na lei, ou não foram implantados ou não funcionam. Os trabalhadores não ganharam a multifuncionalidade esperada. A multiplicidade de sindicatos na atividade portuária joga contra essa tendência que enxugou quadros inchados em outros países.

Mas não são só OGMos e Ceneps que devem passar por reformulação. O equacionamento dos acessos de modais ferroviários, dutoviários, hidroviários e rodoviários tem urgência equivalente. E na questão de quadros de carreira que chegam até a diretoria, deixando a nomeação política só para a presidência, o modelo da Petrobrás pode ter alguns elementos adotados nas companhias docas. Tudo em nome da profissionalização e do desempenho.

Vitória da transparência

Duas decisões oficiais, uma deste mês de fevereiro e outra pouco anterior, apresentam potencial para uma mexida profunda na política portuária brasileira para os próximos anos.

A primeira delas vem da Agência Nacional dos Transportes Aquaviários. No dia 22, a Antaq revogou resolução dela mesma, editada em setembro de 2010, que permitia a renovação de contratos de arrendamento de terminais existentes antes da Lei 8630/93.

A lei determinou revisão desses contratos e permitiu duas renovações de dez anos cada. Que expiram no ano que vem.

Esses contratos não passavam por licitação. Eram simplesmente ajustados entre as empresas de operação e as companhias administradoras dos portos. E a dimensão dos números envolvidos é significativa. São 77 terminais nessas condições em 15 portos, entre eles Santos.

 A agência sofria duas pressões opostas. De um lado, a Associação Brasileira de Terminais Portuários. A ABTP tinha conquistado na justiça um prazo de 30 dias a partir de 25 de janeiro para que a Antaq tornasse públicas as condições das renovações previstas na resolução agora revogada. A estratégia era a de chegar a um ponto sem retorno. E acenava com investimentos de R$ 3 bilhões nos terminais com a renovação das concessões.   

De outro lado, o governo federal. A presidente Dilma Roussef sempre deixou clara a opção pelas licitações. E a Antaq tinha recebido um parecer da Advocacia Geral da União nesse sentido: o de licitar.

A decisão encaminha os investimentos para ganhos de produtividade e de eficiência e modernização das operações portuárias. Porque sem garantia de renovação dos contratos, as atuais operadoras não programavam investimentos. E sem a possibilidade de disputar os terminais, as empresas interessadas em entrar na atividade também não faziam essa programação.

A partir de agora os departamentos de planejamento de umas e de outras começam a se organizar. As licitações devem ser promovidas ainda neste ano. Mas as concessionárias atuais pretendem discutir judicialmente a questão.

Licitações confirmadas, é fácil prever investimentos até superiores aos R$ 3 bilhões, arrecadação maior do governo com as concessões e uma dinamização da operação. 

A outra decisão é do Ministério Público Federal: a de questionar na Justiça a legalidade da entrega da administração de um porto a uma empresa sem licitação.

O caso concreto é o do porto do empresário Eike Batista em São João da Barra, no Rio de Janeiro.

A idéia nuclear do Complexo do Açu é a de um distrito industrial (montadoras, siderúrgicas e usinas termelétricas) em torno de um porto projetado em terreno do empresário.

 O projeto vem enfrentando outras dificuldades como resistência às desapropriações necessárias, investigações sobre uso de milícias para retirada de moradores dessas áreas, críticas de ambientalistas e o monitoramento da Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos.

De todos, o questionamento legal é o mais importante. E vai ser acompanhado tanto pela banda do governo Dilma entusiasmada para levar aos portos o modelo de leilão dos aeroportos como em Santos por uma empresa que tem projeto de instalar berços de atracação em terreno particular no bairro da Alemoa. 

Chegou a vez dos portos?

O suce$$o do leilão dos aeroportos deu uma injeção de entusia$mo no governo Dilma. A frase “Agora chegou a vez dos portos” ecoou lá na Esplanada dos Ministérios. 

Será que chegou mesmo? Ou esse conceito é coisa de gente desinformada?

A privatização da operação portuária vai apagar 20 velinhas no aniversário do ano que vem. Ou seja, no grosso, faz tempo que a União recebe taxas de arrendamento de terminais e não gasta mais quase nada na movimentação de cargas no sistema portuário.

Este por sua vez, dá conta do recado. Recordes têm sido quebrados todos os anos. Mesmo assim os investimentos em novos terminais continuam fluindo e Santos, nesse quesito, atravessa fase exuberante. Os terminais existentes ampliam e sangue empresarial novo está chegando para disputar o mercado.

Esse cenário aponta, portanto, para outra direção.

O governo federal deveria, isso sim, concentrar esforços para melhorar a logística de acesso aos portos.  

Dutovias, ferrovias, hidrovias e rodovias. Essas deveriam ser as prioridades.

Se até os chineses pensam em construir estradas de ferro para melhorar o fluxo em território brasileiro dos minérios que eles compram, será que o empresário daqui, com os olhos mais abertos, não vai aproveitar essas oportunidades?

A necessidade de avanço logístico tem uma contrapartida na “burrocracia”. Além de investir nos modais que levam cargas aos terminais portuários, o país precisa diminuir o número de carimbos necessários num documento de exportação.  

Legislação simplificada, menos tributos, menos burocracia e mais infra-estrutura logística. Essa é verdadeira receita para melhorar o índice de empresa brasileiras que têm acesso ao mercado internacional: só 4 de cada mil.

Navegação de Posts